Lembro-me como se fosse ontem do dia em que você nos encomendou um conto de tema livre para casa. Aspirante à escritora, no alto dos meus vinte e poucos anos, logo fui pra casa e me pus a pensar sobre o que escreveria, como começaria o texto, enfim, o trabalho passado havia me enchido de alegria e vontade de entregar algo que merecesse nota dez. Pois passei muito tempo a pensar e a escrever e, finalmente, o texto ficou pronto. Lá estava ele como um bebê que acabara de vir ao mundo. E lá estava eu como uma mãe literária de primeira viagem...
Minha surpresa, professora, foi quando recebi de volta o conto com uma nota nove. Não que tenha achado a nota ruim, mas é que eu - pela primeira vez - havia feito de fato um trabalho com prazer e fiquei na esperança de que minha nota fosse proporcional a esse sentimento. Mais surpresa ainda fiquei quando ouvi suas palavras: "Não posso acreditar que você tenha escrito esse lindo texto. Está muito bem feito, merece nota máxima mas, pela minha desconfiança, dei um desconto. Nota nove". Minhas recordações desse dia não são muito boas. O que havia sido um momento de êxtase para mim se transformou em decepção, frustração. Custava a acreditar que você, professora, que estava ali para incentivar os alunos, tinha conseguido tirar de sua mente brilhante palavras dignas de quem não merecia aquele posto.
É, professora, mas o mundo dá voltas.
Sempre soube que tinha talento para a escrita, desde meus tempos de colégio. Mas, nunca havia inscrito nenhum trabalho em concursos. Há pouco tempo pipocou um e-mail de uma editora na minha caixa de correio, convidando jovens escritores a concorrer a prêmios com quantos textos quisessem. E aí, professora, eu inscrevi aquele mesmo texto. Você não deve nem se lembrar dele... Nem de mim... Uma mexidinha aqui, uma atualização acolá... Pronto, apertei o "send".
Como você, professora, a comissão julgadora também não me achou merecedora do dez. Mas, pré-selecionou o meu texto, entre mais de mil e quinhentos concorrentes. E ainda vai publicá-lo junto aos ganhadores e outros pré-selecionados. Não, a editora não me disse nada parecido com o que ouvi naquela sala há mais ou menos dez anos. Pelo contrário. A editora sabe o real significado da palavra "incentivo". Num país onde poucos lêem, poucos escrevem o português correto, nada melhor do que gestos como esse. E nada pior do que permitir o ingresso de professores com muito preparo intelectual - isso não posso negar que você tem de sobra - mas pouco preparo emocional e psicológico, em faculdades de nome, espalhadas por esse nosso Brasil.
xxx
Pra quem ficou curioso, a professora em questão é Ana Arruda, viúva do grande mestre Antônio Callado e esse concurso me libertou da terrível sensação de que sempre alguém duvidaria da minha capacidade de escrever um bom texto.
quinta-feira, dezembro 27, 2007
sexta-feira, dezembro 07, 2007
O doce que cura o amargo... Ou não...
Acabo de comer um delicioso ninho de ovos e não consigo ter pensamentos amargos, mesmo procurando inquietamente por eles para dar continuidade à série iniciada dois posts atrás.
A propósito, chove no Rio, o calor é infernal e as malditas baratas habitam cada quadradinho das pedras portuguesas. Novamente peço desculpas a Gregor Samsa e G.H, mas eu odeio essas criaturas com todas as minhas forças.
Hum... E não é que isso foi amargo? Garçom, mais um ninho de ovos, por favor!
A propósito, chove no Rio, o calor é infernal e as malditas baratas habitam cada quadradinho das pedras portuguesas. Novamente peço desculpas a Gregor Samsa e G.H, mas eu odeio essas criaturas com todas as minhas forças.
Hum... E não é que isso foi amargo? Garçom, mais um ninho de ovos, por favor!
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