quinta-feira, março 30, 2006

Brasília Cinza

O céu de Brasília está cinza, como ela nunca viu. A chuva cai lá fora. Ela repensa seu dia, sente saudades de seu amor... O companheiro (Nunca se refere a ninguém assim... Mas, vejam bem, ela está em Brasília...) ao lado lhe oferece lindos e crocantes biscoitos de polvilho. "Terão eles glúten?", pensa ela. Não aceita. O tempo de conexão gratuita vai acabando e tantas imagens vem à cabeça, tantas vozes, tantas lembranças. Ela passou o dia com crianças, deve ser por isso. Crianças trazem nostalgia, fazem a gente ter contato com a pureza. Ela corre, seus dedos teclam rápido, como algo na história de "Alice no País das Maravilhas". Ela vê as fotos da praia, fala com a chefe no telefone, pensa, repensa... Angústia e alegria estão presentes, se fundindo numa grande antítese. A mente inquieta cansa. E o céu de Brasília continua cinza...

quinta-feira, março 23, 2006

Noventa

Mais uma vez era picada pelos inúmeros mosquitos que circulavam pela Lapa, quando o amigo blogueiro ( Babel Turbo)
veio lhe mostrar seu último texto. Falava sobre o tempo. É claro que depois de ler, a mente inquieta que vos fala começou a refletir e emocionada ficou.

Era aniversário de sua tia avó, a Tia Carmen. Noventa anos. A família fez uma pequena festa para não deixar passar em branco a data tão querida. Havia muito tempo que não aparecia por lá. Era como se o apartamento tivesse sido congelado no tempo. A nostagia foi imediata. Foram tantos Natais passados lá. As esculturas, velas, plantas, porcelanas, estátuas, louças... Os armários, móveis, quadros... Todos no mesmo lugar, fazendo aniversário junto com Tia Carmen. Talvez, seus maiores companheiros durante todos esses anos de vida. Vinte quatro horas ao lado dela, no silêncio da tarde, no calar da noite, no barulho do amanhecer.

Noventa anos, com carinha e corpinho de setenta. A cabeça? Melhor que a de muito jovem por aí. Chegou até a falar a letra todinha, sem hesitar, da música que seu falecido marido compositor, o Tio Reis, havia feito para ela. "Um homem magnífico, gentil, companheiro", dizia ela sobre o Tio Reis, de quem os mais novos da família têm apenas uma turva lembrança.

Tia Carmen estava com um ar tranqüilo e, nessa noite, foi dona de palavras bonitas e inspiradoras. Falou sobre a vida, com a categoria de quem realmente a conhece. E bem. Enquanto ela discursava leve e pausadamente, comendo sua gelatina de morango (segundo ela, o segredo de chegar aos noventa bem é comer um potinho de gelatinha por dia), a mente inquieta ia longe. Os olhos chegaram a ficar molhados, mas ninguém notou. O pensamento invadia as camadas mais profundas do cérebro, a viagem começou a ficar intensa. E a base de toda essa reflexão era... Quem? O tempo. O tempo do meu querido amigo blogueiro, o tempo que cura tudo, o tempo que não pára, o tempo esclarecedor, o tempo que traz sabedoria, rugas... O tempo.

Ontem, com certeza, passei a conhecê-lo melhor.

segunda-feira, março 20, 2006

Filme com lavanda

Hoje, a vida cheira a lavanda e tem um "quê" de "Em Algum Lugar do Passado". Aliás, esse filme é lindo ou não é?

quinta-feira, março 16, 2006

Parabéns, Mente Inquieta!

Eu nem me dei conta, mas meu amigo Marco Santos lembrou bem: no dia 16 de março de 2005, eu inaugurava meu blog, com o texto "Amor Genuíno". Portanto, hoje ele faz um aninho de vida! Quantos textos, quantas histórias, quantas emoções...

Gostaria de agradecer aos meus 3 leitores assíduos (minha querida tia Sonia, Renata Bonora e Marco Santos) e também aos que visitam esta bella mente só de vez em nunca, pelas palavras sinceras de carinho e pelas reflexões que, às vezes, deixam registradas aqui.

Vida longa ao "Mente Inquieta" e que mais e mais visitantes surjam ao longo de sua história!

A Felicidade e o Medo

Um dia, minha terapeuta disse:

"É, Isabella, na maioria das vezes a felicidade vem acompanhada do medo. Medo que ela acabe logo, que seja um momento muito passageiro".

Fiquei pensando sobre essa frase alguns dias e descobri que a afirmação procede. Num dos meus textos anteriores, já havia dito que a vida arruma pra depois desarrumar e assim corre o ciclo. Uma hora está tudo bem, outra hora nem tanto. Mas, é curioso mesmo como momentos de plena felicidade vêm acompanhados do medo. Estou numa fase em que chego em casa do trabalho e não quero mexer no cenário que encontro. Às vezes, a casa vazia, arrumadinha do nosso jeito, o silêncio da mata; outras vezes, maridão saudoso, a cama desarrumada, a louça por lavar... Não importa com o que me deparo, não quero mudar. E, de repente, sou invadida por um sentimento de felicidade plena, como se o trabalho não tivesse me estressando, a grana não estivesse curta, eu não estivesse cansada, o Rio de Janeiro continuasse lindo e nada no mundo pudesse interferir sobre aquilo tudo. E é incrível como, imediatamente depois, vem um diabinho (aquele que não sai ali, da orelha esquerda) que diz: "Aproveite cada minuto dessa sensação, você não sabe o que acontecerá no próximo segundo". Isso acontece com vocês também, caros leitores? Ou sou uma paranóica de primeira "catiguria"?

Não tenho conclusões para esse texto. Brotou e fui escrevendo... Só sei que deitar ao lado de quem gosto, no fim de um dia cheio de tarefas a cumprir, tem sido a parte mais colorida de todo esse contexto.

sábado, março 11, 2006

D. Nélia

Como é bom lembrar que existe gente boa no mundo, de bem com a vida, disposta a fazer gentilezas, levar uma prosa...

Hoje, vocês vão conhecer D. Nélia, atendente do Banco Real, de Botafogo, no Rio de Janeiro. As mãos castigadas pelo tempo, as rugas no rosto, as pernas já inchadas fazem dessa personagem o ser mais jovem que conheci.

Cheguei ao banco, por volta das 15h30, para tirar folhas extras de talão de cheque. Isso porque as agências mais perto da minha casa - que tinham o serviço disponível - eram essa e a da Barra da Tijuca. Estava precisando muito das folhas, porque tinha que fazer um depósito urgente, naquele mesmo dia. Atentem para o fato de que eram 15h30 e o banco fechava às 16h. Como sempre, fazendo tudo em cima do laço. Fui apertando os botões da máquina, e nada acontecia. Hã? Sim, a máquina estava com problemas. O sangue subiu até metade do corpo (pois agora faço yoga e não me estresso como antes - até metade do corpo já é um grande progresso!!!) e, então, perguntei a uma das atendentes, uma senhora simpática, o que estava acontecendo. Ela me disse, gentilmente, que chamaria o técnico para resolver o problema e que eu sairia dali em alguns minutos com meus cheques. Acreditei naquela voz calma, serena, naquela senhora que me tratava como uma neta, me chamando ora de minha filha, ora de minha querida. De um jeito tão terno que - em meio à confusão do meu dia, roteiros mil para escrever, pautas pra fazer, dinheiro pra depositar na conta dos outros - me deu vontade de deitar em seu colo para que me contasse histórias de seu tempo.

"Se você estiver cansada e quiser esperar lá dentro, sentada, eu lhe chamo quando a máquina estiver pronta", disse a senhora, cujo nome eu já sabia que era Nélia, depois que li, discretamente, seu crachá. Agradeci, mas disse que estava bem ali, em pé, diante daquela máquina, da qual eu era totalmente dependente naquele momento. Aí, me peguei pensando na quantidade de tempo em que aquela senhora ficava em pé ali. E perguntei: "A senhora tem que ficar em pé o tempo todo?" "Sim", disse ela. "E por quanto tempo?", perguntei. "De 10h às 16h", respondeu, com um sorriso no rosto, como quem agradecia o fato de estar em pé e trabalhando. É, chega a ser irônico uma senhora que fica 6h em pé, todos os dias, perguntar para uma moleca, de seus quase trinta anos se ela está cansada e quer sentar...

O tempo foi passando, os ponteiros do relógio se aproximavam das 16h e nada da máquina. Enquanto isso, conversava com D. Nélia sobre os mais variados assuntos: o ônibus que ela pegava da Tijuca até Botafogo; as pessoas gentis que ela recebia; a pessoas grossas que ela tinha que receber; os meus traços bonitos de artista de TV... Segundo D. Nélia, maquiagem leve e cabelos ao vento eram suficientes para que eu me tornasse a sensação da TV Globo! Quanta ingenuidade, quanta bondade, quanta maravilha dentro de um ser humano só! Expliquei a ela que não era bem assim, que hoje a gente tem que namorar gente famosa pra subir na vida, mas que eu estava muito satisfeita com o maridão, que não troco por nada nesse mundo. Enfim, o papo fluiu, encontrei Virgílio, um amigo figura, que não via há muito; encontrei a mãe da Bonora, Vera, e levamos uma prosa rápida.

De repente, a máquina recuperou a vida e pude tirar minhas tão esperadas folhinhas. D. Nélia estava lá, ao meu aldo, não me deixou um minutinho sequer. Arrumou as folhas para mim, colocou-as em ordem. Já eram mais de 16h e eu não estava nem um pouco preocupada com o depósito que, agora, só poderia ser feito no dia seguinte. E essa tranqüilidade se devia exclusivamente a ela, D. Nélia, que nem imaginava o bem que me fazia. Eu estava amparada, protegida dentro daquele banco.

Chegou a hora de ir. Fiz questão de me despedir de D. Nélia, com dois beijinhos e um abraço! "Vai com Deus, minha filha", disse ela. "Obrigada", disse eu.

Que guerreira a D. Nélia. Deus me ajude a chegar a essa idade assim. Que exemplo a D. Nélia. Que terapia a D. Nélia. Que beleza a D. Nélia. Quem dera se o mundo fosse feito só de Donas Nélias!!! E quem dera se todas as idas ao banco fossem a assim...

D. Nélia para presidente!